sábado, fevereiro 17, 2007

Ainda o PL-74-2007

Pois então, eu compilei os textos a respeito do PL74-2007 num post, e enviei a Solange, e quem tá respondendo é o Wilson, segue abaixo a resposta dele :


De: Wilson Teixeira ]
Enviada em: sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007 13:14
Para: marcelovarda@gmail.com
Assunto: Re: Pl-74-2007

Saudações!

A respeito da mensagem encaminhada à deputada Solange Amaral (PFL-RJ), tenho o prazer de responder às questões que estão sendo levantadas em decorrência da apresentação do PL 74/2007, de autoria dela.

Começo pelo fim, abordando o tema da prezada advogada.

Citando o seguinte: motoristas transgressores, que mataram por desrespeitarem artigos do CTB, foram remetidos, por desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao tribunal do juri.

No Rio Grande do Sul, o desembargador Danúbio Edon Franco decidiu, por entender que o motorista que dirige veículo automotor embriagado causando a morte de outrem assume o risco de produzir o resultado danoso, restando caracterizado o dolo eventual. Em delitos desta natureza, neste momento do processo impõe- se a pronúncia, cabendo ao tribunal do júri julgar a causa" (TJRS- RSE 70003230588 - 3a. C. Crim - J. 18.04.2002).

Em São Paulo, o desembargador Geraldo Xavier decidiu, ao se manifestar sobre pedido de desclassificação para a forma culposa, por entender que "quem desenvolve velocidade excessiva em seu veículo, não obstante advertido para o perigo, na melhor das hipóteses assume o risco de produzir o resultado lesivo", não acatar o recurso (TJSP - RSE 249.097-3 - São Paulo - 2a. C. Crim - J. 28.04.1999).

Ainda em São Paulo, o desembargador Dante Dusana, ao se pronunciar sobre recursos de desclassificação para a modalidade culposa, decidiu que "quem se lança numa competição automobilística de velocidade, numa cidade populosa, à custa da possibilidade de produção de um resultado lesivo, age igualmente com dolo eventual de homicídio, lesões e danos". (TJSP - RSE 249.440-3/5 - 5a. C. Crim - J. 30.12.2000).

Voltando mais atrás no tempo, cito julgado onde o elemento inabilitação, juntamente com outros, levou ao reconhecimento do dolo eventual: o desembargador Aristides Pedroso de Albuquerque Neto pronunciou que "deficiente físico que dirige automóvel não adaotado à sua condição, embora inabilitado, e, em alta velocidade, após derrapagem, colhe criança nas proximidades do cordão da calçada, assume alto risco do resultado morte produzido. Apelo improvido". (Apelação Crime No. 694038860, 3a. Câmara Criminal do TJRS, Canela, 29.09.94).

Para advogados vários, entretanto, o dolo eventual nos acidentes de trânsito é mera ficcção jurídica.

Para alguns desembargadores, como os que citei, a ficção utlrapassou a imaginação e tornou-se realidade.

Cito Nélson Hungria: "Para a existência de dolo eventual, basta que o agente, na dúvida sobre se o resultado previsto sobreviria ou não, atravesse o Rubicon, não se abastendo da ação, pois quem age em tal dúvida assume o risco de quanto possa acontecer".

Quem desejar conhecer o posicionamento da jurisprudência em relação ao reconhecimento do dolo eventual nos crimes de trânsito, enumero algumas condutas onde este foi tido como configurado:

- Ultrapassar semáforo fechado em alta velocidade (RT 571:404)

- Efetuar derrapagem proposital em alta velocidade (RT 522:468)

- Conduzir em alta velocidade (TJSP SER No. 249.097-3)

- Conduzir em alta velocidade, invadindo a via de sentido contrário (TJRS Ap. Crim. No. 697153161).


Eu não sou adovgado. Sou jornalista. E pedalo. Todo dia. Largas distância. Em Brasília, onde moro.

Hoje, coincidentemente, só não fui alvejado por uma van de transporte escolar porque o ouvido esquerdo me informou que ela estava tão próxima a mim que se eu não saltasse fora do bordo da pista para o acostamento arrebentado, maltratado, esburacado, eu seria atingido. A van escolar passou a menos de 10 centímetros de mim, na mesma velocidade em que vinha, como a dizer: a via de rolamento é propriedade exclusiva dos veículos automotores. Se o motorista tivesse me atingido e se contra ele fosse instuarado um processo, entendo que ele deveria, sim, ser processado por crime doloso. Afinal, não importa se ele conhece ou não a lei. A alegação de desconhecimento da lei não torna ninguém inimputável.

Creio que respondi a questão sobre guardar 1,5 metros de distância, em média, ao passar ou ultrapassar ciclista.

Em relação aso entendimentos de advogados, cada um tem o seu, ou cada grupo cultiva o entendimento que acha mais correto.

Eu, como ciclista, não tenho dúvida de que um motorista embriagado, que invade o acostamento em alta velocidade e vitima um ciclista ou pedestre cometeu crime doloso. E, nesse caso, não imbuído de eventualidadde.

Quem acredita que agravar a lei em nada resultará deveria, penso, consultar os julgados sobre a matéria em que motoristas tentam evitar serem processados por crime doloso, ainda que imbuído de eventualidade, e desembargadores, como os que citei, não acolhem o recurso ou a apelação nesse sentido.

Quem pedala, de fato, pelas ruas e estradas das cidades brasileiras, sabe que muitos dos crimes cometidos no e do trânsito são praticados dolosamente por motoristas. é fácil perceber. Basta pedalar. E se quem pedala também é motorista habilitado, percebe o que observo com clareza meridiana.

O direito - a prática do direito - contempla a dialética, a tese, a antítese, a síntese e por aí afora. E, portanto, o jogo de palavras.

O motorista embriagado que matou Pedro Davison, em agosto do ano passado, em Brasília, ao invadir faixa em que não poderia transitar à noite, e que depois fugiu, sendo interceptado em uma barreira pela polícia, cometeu, no meu entendimento, - e no vários promotores do Distrito Federal - crime danoso. Mas foi indiciado, apenas, por crime culposo.

Juridicidades à parte, o fato concreto, real, é que cristalizou-se a cultura de que as ruas, as estradas, as vias de rolamento no Brasil são propriedades exclusivas dos veículos automotores.

Apesar de o Código de Trânsito Brasileiro priorizar, antes dos veículos, as pessoas (Art. 1o. Parágrafo 1o.) e rezar, no Art. 1o. Parágrafo 2o. que "o trânsito, em condições seguros, é um direito de todos".

Quanto à dra. Renata Buião, rezo a Nossa Senhora dos Ciclistas para que, se tiver o hábito de pedalar pelas ruas da cidade onde mora, jamais seja alvejada por um motorista que, apenas por pressa, resolveu cortar caminho pela contramão, invadindo o acostamento justamente no momento em que ela pedalava, alvejando-a sabendo que cometia uma trangressão, consciente de que poderia vitimar alguém. Agora, se alguém tem a disposição intelectual de acreditar que um motorista que dirige pelo acostamento na contramão não está assumindo conscientemente o risco de vitimar uma pessoa, aí, bem, aí é outra história. Ou melhor, é uma questão de achismo.


Camaradas do pedal, agradeço a disseminação do texto

Abraço a todos, Wilson Teixeira Soares.

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