sexta-feira, julho 02, 2004

Florianópolis rebelde


02/06/2004 - Por Elaine Tavares/ jornalista na UFSC - Mediocridade e reacinarismo. Esse é o retrato da imprensa catarinense no episódio que tem parado a cidade de Florianópolis desde a segunda feira, dia 28. Indignados com o aumento abusivo das passagens do transporte coletivo, estudantes e população em geral têm realizado protestos de fechamento dos terminais, trancamento da ponte e fechamento das ruas, num gesto claro de cidadania. Eles querem ser ouvidos por uma prefeitura que prefere administrar para a elite, para os empresários do transporte, do que para a população em geral.

Para se ter uma idéia, um trabalhador está pagando 3 reais para fazer um percurso de menos de 30 quilômetros. Somando isso duas vezes ao dia, são 6 reais só para o transporte. Se considerarmos que a pessoa precisa comer e que um almoço médio não sai por menos de 5 reais, já são 11 reais por dia, só com o básico. Multiplique-se isso por 20 dias úteis – entendendo que o cara vai ter que ficar trancado em casa durante o fim-de-semana - e temos 210 reais. Imagine agora se a pessoa ganhar o salário mínimo? Vai sobrar 50 reais. Isso significa que a pessoa não vai poder ter mais nenhum gasto, sequer com aluguel. Então, para trabalhar e comer, o trabalhador de Florianópolis não vai poder morar. É em função dessa conta que as gentes estão se mobilizando. Todas as manhãs, trabalhadores e estudantes trancam os terminais, fazem protestos e exigem que a prefeitura volte atrás. A imprensa os demoniza.
Os porta-vozes oficiais do sistema fazem acaloradas defesas do direitos de ir e vir – esquecem que é impossível fazer isso com a passagem a 3 reais. Chamam a garotada de baderneiros e – pasmem – chegaram a chamar o incêndio de um ônibus, de “atentado”, como se o protesto fosse um ato de terrorismo. Absurdo total. A mediocridade dos textos dos articulistas beira o risível. Já os repórteres de TV e jornal se limitam a fazer o velho jornalismo dito “imparcial”. Na comunidade também assoma o conservadorismo e o reacionarismo. Pessoas xingam os manifestantes que, segundo eles, atrapalham suas vidas. Querem ter o direito de continuarem a ser explorados. Cordeiros, preferem se acomodar em vez de lutar por seus direitos.
A garotada – a maioria dos manifestantes é de estudantes secundaristas – grita, berra, apanha da polícia, é presa, reivindica, se machuca e faz a luta pelos que os xingam. Amanhã, se a passagem baixar, por causa da luta desses adoráveis maluquinhos, duvido que essas pessoas terão a dignidade de depositar a diferença que pagariam, para financiar – quem sabe - a luta dos estudantes pelo passe livre. É fácil chamar de baderneiros os que lutam. E é mais fácil ainda se beneficiar da luta desses mesmos “baderneiros”. Florianópolis acende a chama da rebeldia. Florianópolis tem gente que pensa, que grita, que exige dignidade, direitos. São meninos e meninas das escolas públicas, da universidade, são trabalhadores cheios de vontade de mudar o mundo. São seres humanos que transcenderam da mediocridade dos cordeiros. Florianópolis protesta, e é lindo.

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